Há dois anos, mais ou menos, sentei para escrever uma crônica sobre o domingo e, lógico, dei o título crônica de domingo, obviedade de quem escreve buscando ser fiel aos fatos. Pensei, cá com meus botões da surrada camisa, quero fazer uma crônica olhando para o sol de domingo pela manhã, quando o céu fica azulzinho e as crianças brincam na calçada de casa. Daquelas crônicas que lia nos jornais A Tarde e Tribuna da Bahia, no passado, nos meus tempos de outrora.Queria lêr de tudo e sonhava com o futuro olhando pelo buraco da fechadura como um dia escrevera o genial Nelson Rodrigues. A crônica tinha que chegar como os domingos molhados de ternura, embriagados de saudade. Sempre quis ser poeta na adolescência. Queria ser poeta, jornalista e até jogador de futebol, mas eu tinha o sangue rude dos pernas-de-pau e não passei de um medíocre ponta esquerda de dribles desastrados. Quem viveu comigo aquele tempo sabe do que falo. A crônica de domingo chega me fazendo refletir sobre tudo e, mais ainda, que durante muito tempo inverti as bolas. Fui velho quando era menino, sou menino agora que a maturidade bate à porta.
Sou capaz hoje de dar bom dia à natureza e me conformar apenas com o sorriso, a atenção, a palavra cuidada que recebo. A graça de estar pertinho das pessoas queridas e amadas é um milagre que contemplo dias e dias depois de acontecido. Os momentos são únicos e cada vez me convenço mais que a vida é uma missão. Missão de ser gente na essência da palavra, amar e ser amado, jogar na lata do lixo tudo que é egoísmo e ganância. Quero, mais do que nunca, viver meu tempo, porque meu tempo é esse e nenhum outro. Tudo isso, num domingo de manhã, com a música. E a música que ouço é uma continuidade de um poema que dizem ser de Jorge Luiz Borges, “ devia ter amado mais, ter sorrido mais, ter visto mais o sol se pôr.” É esse domingo se abrindo à felicidade enquanto apanho palavras para preencher o vazio. Sorte tiveram Carlos Drummond de Andrade e tantos outros poetas fantásticos. Eles souberam sempre escrever o que sentiam. Eu, como um menino ousado, fico por aí rabiscando versos que não viram rimas e nem chegam aos corações. Mas é domingo, meu camarada.
Aos domingos gosto de acordar cedo, aproveitar cada segundo desse dia extraordinário, escrever muito e apagar tudo logo em seguida. Como posso sonhar em escrever memórias se não consigo guardar nada que escrevo? Mas a crônica de domingo devo concluir. A semana é sempre corrida, estressante, com tempos escassos e caminhadas apressadas, olhares ligeiros e quase nenhuma palavra com quem se cruza nas ruas e avenidas. A gente tem a impressão de que a vida é crua e fria, amargurada. E dorme com os sonhos que ficaram guardados por tantas horas do dia que se vai. O sábado faz mais ou menos a intermediária. Faz a ligação entre a semana e o domingo. Ah, o domingo. Domingo de versos alegres, de amores a conquistar, de música suave e preguiça gostosa no corpo. Como disse no começo, gostaria de fazer uma crônica olhando para o sol de domingo pela manhã, uma manhã molhada de ternura, embriagada de saudade. O tempo da gente é esse, meus amigos.
Vitória da Conquista, 12 de março de 2011.
Continue a "rabiscar versos" que tocam aos corações.
ResponderExcluirBelíssima crônica,parabéns Pedro Macuco.
Essa crônica é linda. Um texto vivo, que retrata nosso cotidiano e riquíssimo em cultura e bom gosto artístico. Parabéns meu amigo Pedro pelo brilhante texto.
ResponderExcluirNem deve se lembrar mais de ter a escrito ... rs
ResponderExcluirContinuou a escrever?
Nem deve se lembrar mais de ter a escrito ... rs
ResponderExcluirContinuou a escrever?